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Amarga Adaptação
18

 

Março

 

2010
17

 

Abril

 

2010
Lawrence Weiner - Amarga Adaptação
Lawrence Weiner - Amarga Adaptação
Lawrence Weiner - Amarga Adaptação


«No triângulo formado pelo autor, a obra e o público, este último não é de forma alguma um elemento passivo, que apenas reagiria em cadeia, mas antes uma fonte de energia que contribui para fazer a própria história. A vida da obra na história não é pensável sem a participação daquele a quem se dirige». 1


Hans Robert Jauss



O leitor


Dada a objectividade da obra de Lawrence Weiner torna-se redundante reflectir em torno de algo para além daquilo que nos é apresentado. De certo modo, este artista deixa-nos ansiosos por uma “luz ao fundo do túnel”, algo que ajudasse a encerrar o seu trabalho numa categoria estanque e de fácil compreensão. No entanto, todos os esforços empreendidos cada vez mais se afastam da verdade que os seus trabalhos possuem. Lawrence Weiner é absolutamente directo nos seus propósitos e nos seus procedimentos. Tentar complexificar a sua obra afasta-a da sua intenção enquanto Arte.


Na realidade, as obras que executa, numa clara preocupação com a materialidade, são verdadeiras esculturas, no sentido de serem objectos dispostos a sofrer os processos inerentes a qualquer execução artística. E espera-se que assim sejam vistas: como materiais dispostos, abertos à sua livre recepção.


É do acolhimento da obra, ao invés da sua produção, que aqui nos ocuparemos. Até porque o crítico, como afirma Jauss, é necessariamente um leitor antes de poder situar ou compreender a obra ou de fundamentar o próprio juízo sobre a consciência da sua situação. Assim sendo, este texto não se resume ao modus operandi do artista (até porque este não existe) ou à análise formal da obra de arte, mas antes em torno de um elemento quase sempre posto de lado mas cujo protagonismo não nos deixa ser indiferentes. Falamos do espectador, e como se tratam de trabalhos que utilizam as palavras, do leitor 2.


Em Weiner não se trata de usar metáforas ou frases que tenham como intenção criar ambiguidades, múltiplos significados ou interpretações herméticas complexas, mas demonstrar através da permeabilidade da linguagem como meio, como toda a obra de arte é fruto de uma enorme liberdade. Quer para quem a produz, quer para quem a recebe.


A obra acede, assim, à existência pelo acto de interpretar, indiferente aos intentos do autor mas focada nas expectativas e adaptações do seu receptor. À estética tradicional da produção e da representação substitui-se (ou melhor funde-se) uma estética da recepção e dos efeitos.


É esta a importância da tradução no trajecto de Weiner: tornar mais compreensíveis e acessíveis os textos que utiliza, mas igualmente recontextualizá-los no ambiente próprio e nas condições concretas do seu acolhimento. Como qualquer tradução é traição, qualquer adaptação é amarga.


A sua obra constitui-se na perspectiva de uma verdadeira dialéctica: da obra com a cultura, do autor com a obra, do autor com a cultura, da obra com o seu receptor, do autor com o seu receptor, do receptor com a cultura, numa interacção mais aberta e infinita de perguntas e respostas. É este diálogo que afirma a relação entre a arte, no seu sentido mais lato, com a própria vida.


A dimensão social que reforça a importância da experiência do receptor é aquela que afirma a forma como a obra intervém no horizonte de expectativa do nosso quotidiano, orientando ou modificando a nossa sua visão do mundo. Esta talvez seja uma missão demasiado demagógica para a Arte mas com esta conclusão podemos afirmar que, sem dúvida, à semelhança do texto em si, a abertura e a virtualidade dos seus trabalhos, na sua dimensão interactiva e performativa, causa algum tipo de transformação naquele que a recebe. Esta é a maravilha de qualquer experiência em torno de uma leitura: quando o texto deixa de ter uma função prática, abrindo-se à sua dimensão mais reflexiva, deixando o seu público perplexo e revelando que, na Arte, o processo de percepção é um fim em si mesmo.



Carla de Utra Mendes




1 Jauss, Hans Robert, A literatura como provocação (História da Literatura como provocação literária), Lisboa: Vega, 1993, pp.56,57

2 A importância que este detém nas obras de Weiner foi sempre por ele reconhecida desde o início na sua espécie de manifesto (preferimos declaração de intenções) de 1968:

1. THE ARTIST MAY CONSTRUCT THE PIECE

2. THE PIECE MAY BE FABRICATED

3. THE PIECE NEED NOT TO BE BUILT

EACH BEING EQUAL AND CONSISTENT WITH THE INTENT OF THE ARTIST THE DECISION AS TO CONDITION RESTS WITH THE RECEIVER UPON THE OCCASION OF RECEIVERSHIP


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