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16

 

Maio

 

2013
22

 

Junho

 

2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
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Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013
Julião Sarmento 2013

Na presente exposição de Julião Sarmento, constituída por pequenos conjuntos independentes, mas que podem dialogar, encontram-se temas conhecidos de obras anteriores, como também inovações surpreendentes. Poder-se-á reconhecer as plantas de casas, a imagem e a forma do corpo feminino, a reflexão sobre o gesto da pintura e do desenho, o uso de fotografias alheias, referências diretas ou indiretas a Marcel Duchamp, Alexander Rodtchenko, Barnett Newman, Bart van der Leck, ou ainda a Edgar Degas, Joseph Beuys ou Bruce Nauman, tudo isto formando um pequeno panorama do que se poderia chamar uma autobiografia plástica. Pelo menos de alguns dos seus elementos, dos quais sobressai uma curiosa melancolia que oscila entre a exuberância colorida e o cinzento cor de chumbo, precisamente a cor que acompanha esse estado de espírito. Porém, na iconografia tradicional, tal cor é muitas vezes associada à melancholia generosa , que remete tanto para a invenção, a pesquisa e a curiosidade, como para a contemplação, momentos de vazio e de especulação que seria certamente uma das explicações da célebre fórmula de Delacroix : «L’ennemi de toute peinture est le gris.» [O inimigo de toda a pintura é o cinzento]. Esta temática está reunida no conjunto de obras apresentadas numa parede cinzenta e diante das quais se vê uma espantosa escultura ou um estranho objeto (First Easy Piece , 2013) que é uma interpretação (não é uma cópia) da Pequena bailarina de 14 anos  de Edgar Degas. Apresentada em 1881, numa exposição Impressionista, a estátua causou imensa surpresa e escândalo por ser demasiado realista (indumentária e cabelos verdadeiros, pintura imitando a cor da pele) e demasiado erótica. Julião Sarmento acentuou os traços dessa jovem, quase mulher, e ao mesmo tempo menina e moça, erotizando-os mais fortemente – seios formados, nudez – e, simultaneamente, fazendo com que estejamos perante uma coisa, um objeto, uma matéria inumana. De facto, os quadros pendurados por trás da figura contêm tudo isso : vazio, abstração, objetos e matérias, construções e especulações, entre as quais um esquema explicando como se desenham elipses.


Encontramos outras elipses em certas pinturas e em especial numa (Thing White Plants , 2013), onde um desenho se desenvolve como uma planta ou uma flor a abrir-se que, pela sua forma, nos faz pensar inevitavelmente em certas fotografias do Karl Blossfeldt no seu Wundergarten der Natur  (1932). Encontramos uma interpretação (também não é uma reprodução) da obra de Duchamp, Why not sneeze Rose Sélavy?  (Parce Que Rose , 2013), cujo título, modificado e invertido, aparece num quadro situado por trás da bailarina. Se no baixamos um pouco, podemos ler uma parte do título por baixo da queijeira — que reproduz, desta vez, o dispositivo da obra realizada por Duchamp em 1921. Se a obra de Julião Sarmento se refere a outros elementos duchampianos – os pequenos retângulos, o termómetro, o osso de choco –, não é no entanto um statement  dadaísta, surrealista ou mais um ready-made. Pode ser vista como a citação irónica de uma certa desumanização da arte, necessária ao desvanecimento das formas e à sua perpétua renovação. O que mais importa nesta exposição é, por assim dizer, a formação das formas, como uma forma se torna forma e o devir dessa forma. Se olharmos para aquelas formas penduradas (142 Silicone Leftovers , 2013) como se estivessem num talho – que parecem duras e em cerâmica, mas que são apenas de silicone –, pensamos justamente em partes de um animal, o que elas são de facto: moldes de partes do corpo humano.


 Mais do que acontece em outras obras de Julião Sarmento, nesta exposição aparece nitidamente o tema da finitude humana, e numa espécie de prolongamento barroco frio a dialéctica entre o nada e o ser, o passado e o presente, o fim e o devir. Esta circulação da forma para o informe e da dissolução para a reformação surge claramente nestas obras, as quais interagem e transpõem linhas e cores de uma para a outra; ou entre estas obras e outras, que até podem ter sido feitas com materiais diferentes, se pensarmos, por exemplo nos filmes Parasite  (2003) e Jolie Valse (2007). Por isso, é permitido ver neste conjunto uma grande composição em forma de natureza morta, uma vanitas onde cada elemento nos diz uma mesma coisa: o tempo foge. É o que manifestam as flores representadas (One Too Many  (Yellow ), 2013 / House Plan White Plants , 2013 / Estoril Yellow Plants , 2013), e representadas com cores cinzentas. A pequena maquete doirada (Templo ), apresentada numa montra como se fosse um objeto de grande valor e estima, revela essa vontade de perpetuação, querendo ser monumento para o futuro mas já ruína, fragmento, como lembram também essas numerosas imagens de arquitetura modernista utilizadas pelo artista. Na obra (Yellow Secret , 2013), uma caixinha transparente, como um relicário, contém pequenas penas de maravilhosas cores, logo ao lado de um molde de um ventre e de um pequeno quadro monocromático de cor amarela – cor que reenvia para amarelos presentes em outras obras. Contrariamente ao período barroco, não se pode afirmar que exista aqui uma narrativa ou uma simbólica, ou, pelo menos, que sejam tão fortes como as que existem nesse sistema de representação histórico, onde tudo significa e sempre reenvia para outra significação. Os corpos, as linhas e as cores, no entanto, estão tão presentes como impermanentes, e a bailarina parece desafiar-nos no tempo e no espaço real como está para além de um sítio e de um momento que nunca poderemos atingir. As formas estão presentes e não estão ao nosso alcance. Nos monocromos (Five Frames , 2013) não há imagem, mas há cores muitos vivas, fortes e densas. O movimento do pé está fixado – vê-se o desenho no suporte de madeira – e já desapareceu. Do mesmo modo que as bailarinas de Julião Sarmento recomeçavam o gesto e continuavam numa temporalidade repetida, e, por essa razão, eram sempre formas fugidias, esta exposição assemelha-se a uma grande clepsidra com a areia correndo. Dando-lhe uma volta, tudo recomeça. Tudo recomeça a acabar.



Jacinto Lageira

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