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Curador Miguel von Hafe Pérez
A Forma do Pensamento
19

 

Maio

 

2016
30

 

Julho

 

2016
A forma do pensamento
A forma do pensamento
A forma do pensamento
A forma do pensamento
A forma do pensamento
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A forma do pensamento
A forma do pensamento
A forma do pensamento
A forma do pensamento
A forma do pensamento

ALBERTO CARNEIRO | DIOGO PIMENTÃO | EDUARDO BATARDA | FERNANDO LANHAS | GRAHAM GUSSIN | JOÃO ONOFRE | JOHN BALDESSARI | JORGE PINHEIRO | JUAN ARAUJO | JUAN LUIS MORAZA | JULIÃO SARMENTO | MARLENA KUDLICKA | REGINA DE MIGUEL | TERESA HENRIQUES


Transgeracional, internacional e una. Não existe arte sem pensamento, assim como não podemos pensar a arte sem um compreensivo conhecimento do mundo das formas. No hiato entre a funcionalidade eficaz e a pura especulação conceptual perpetuam-se modos de habitar o desejo de inscrição criativa no mundo. 

Instrumental, aqui, o início cronológico desta exposição que se desdobra sintomaticamente com um artista que soube diferenciar, subverter e continuadamente percorrer caminhos de ida e volta aos extremos anteriormente referidos: Fernando Lanhas, artista, arquiteto, investigador e sonhador.


O seu estudo da Casa do Espaço (1955-62) remete para a uma especulação formal no limite da abstração que pratica de forma pioneira em Portugal a partir de 1944. Por outro lado, apresentam-se três surpreendentes cartões que documentam um projeto seu de arquitetura de uma residência na rua de Grijó no Porto de cerca de 1951. O rigor bauhausiano das três composições fotográficas revelam o cuidado que Fernando Lanhas punha na reprodução numa superfície bidimensional da sua criação arquitetónica, onde só determinados pormenores como o telefone antiquado nos remetem para uma data que a modernidade dos planos construtivos dificilmente deixaria precisar. A fechar a sua participação na exposição mostra-se uma pintura de 2011, realizada no ano anterior ao seu falecimento que replica na sua estranheza uma composição espacial que dialoga em ressonância astral com a Casa do Espaço. 


Juan Araujo efetua uma imersão pictórica no emblemático edifício do CGAC de Santiago de Compostela projetado pelo arquiteto Siza Vieira. Aí ele revela o geometrismo de texturas dos mármores e madeiras que se materializam em superfícies cromáticas reverberantes, num exercício de passagem da realidade espacial do edifício para a sugestão da possibilidade da pintura se erigir como espacialidade própria. Ao reproduzir a planta do edifício sublinha o duplo distanciamento conceptual do ideograma arquitetónico enquanto reprodutor de uma perceção possível do espaço e a pintura como reconhecimento desse processo em diferimento de segundo grau. 


Se nas esculturas de Jorge Pinheiro, realizadas (uma) em 1970, outras ideadas nessa altura e recentemente concretizadas, a formalização coincide com um período em que este autor se aproxima da mais abstrata das ciências – a matemática -, e a mais abstrata das artes – a música -, o contraponto do interesse pela tradição moderna da abstração em Marlena Kudlicka revolve em torno da preeminência do detalhe do pensamento enquanto factor decisório para a formalização precisa de um processo em constante medição dessa incerteza. A tentativa e o erro são aqui assumidos como componentes decisivos no resultado final de esculturas que claramente reinterpretam linhas de atuação que autores ativos no pós-minimalismo como Jorge Pinheiro souberam integrar num horizonte que cruzava o rigor minimal com a atenção à fundacional escultura do primeiro modernismo. 


À clareza das formas destes dois artistas, contrapõem-se os desenhos noturnos de Julião Sarmento intitulados O espaço entre as coisas de 1990. Aqui as imagens recuam ante a definição, apontando para uma informalidade sonâmbula. O espaço entre a imagem e a sua interpretação, o espaço entre o desejo e a ansiedade, o espaço entre a figura e o fundo que se diluem num magma de tensão percetiva. 


Em contraste absoluto, os desenhos de Alberto Carneiro, acabados de realizar em Abril deste ano, num processo de registo quase diarístico, ancoram-se numa visão solar da natureza conceptualizada em articulações distantes no espaço e no tempo. Arquétipos de uma ordenação primordial, resultam fascinantes exatamente na medida em que a sua intemporalidade coincide com uma datação precisa, como se de um diagrama do pensamento em serenidade compulsiva do artista se tratasse. 


A dimensão solar nos trabalhos de Graham Gussin aponta para um deslizamento percetivo que dimensiona a realidade enquanto indecisiva e mutante. Nos seus desenhos projetam-se sombras complexas e impossíveis de quatro ferros que emergem de uma superfície de cimento. Constelações perturbadoras da razão retiniana. No vídeo Silver Form uma forma deslizante ganha vida própria por influência do vento, refletindo a sua superfície metálica cintilações de luz de reverberações quase cósmicas. Como que se de uma entidade com vida própria se tratasse, numa coreografia contingente da reflexão lumínica. 


Regina de Miguel estabelece nas suas instalações um hiato hermenêutico no trânsito entre a credibilidade científica, a especulação narrativa de discursos históricos e a credibilidade da iconografia de arquivo. Questionando o modo como a construção da verdade se estabelece nos diversos canais de conhecimento – o científico, o histórico e o cultural -, aproxima-nos de uma posição mais crítica perante a realidade aqui entendida como sobreposição de relatos sujeitos a uma classificação subjetiva. 

Num plano paralelo, ainda que distante, Juan Luis Moraza interroga as convenções tanto no quadro geral da vivência pragmática, como no da receção artística. Os seus trabalhos desfuncionalizam em dobras ondulantes a retidão imprescindível de materiais de medição, ao mesmo tempo que ironizam sobre a sobrecarga histórica do efeito de plinto, isto é, a passagem e putativa requalificação aurática do objeto aquando da utilização de um dispositivo de exposição clássico e recorrente. 


As obras de Eduardo Batarda também recorrem à ironia e a um olhar sempre irreverente sobre a verdade da pintura enquanto representação significante da realidade ou possibilidade escapista dessa realidade para uma dimensão transcendente. As formas oscilantes, entre a tatuagem e a tripa, ou órgãos sem corpo, abatem-se sobre o espectador como manchas na alta tradição da pintura que curiosamente se reinventa assim com uma seriedade contrastante com o cinismo, a arrogância e até ignorância que perpassam em parte substantiva do estertor da pintura contemporânea. 


John Baldessari curto-circuita outra convenção: a da legibilidade automática das imagens. Num contexto em que somos constantemente assoberbados pela presença de imagens no nosso entorno, mantemos uma sobranceria pouco crítica na sua receção, ou seja, damos mais vezes do que possível como adquirido que estas se descodificam mediante dispositivos de entendimento relativamente simples e básicos. Nos trabalhos deste artista esconjura-se essa simplicidade preguiçosa ao destacar, inverter, apropriar, sinalizar e reformalizar as suas referências de origem, num processo onde o humor se cruza com a determinação conceptual de acrescentar imagens significantes à linearidade da imagem plana e irrelevante.


O projeto de João Onofre, intitulado Promise of a Sculpture, replica a legalidade contratual de acordos entre vendedores e compradores, aqui numa dimensão que estabelece princípios de confiança onde a plausibilidade de um projeto artístico, na sua emergência conceptual, se sobrepõe ao resultado final. Alegoria, portanto, da crença no valor da arte enquanto projeto da responsabilidade partilhada entre criador e recetor, enquanto cumplicidade no interior dos mecanismos internos da criação ainda como possibilidade anunciada. 


Na aleatoriedade processual e significante move-se Diogo Pimentão nas peças que agora apresenta. Ao lançar pedaços de mina de carvão para pequenas superfícies quadradas, marcar a posição em que caem e depois submeter ligações entre elas num desenho posterior, o artista remete-nos para um jogo entre o imponderável e o propositivo, numa dimensão que reclama um espaço de indecisão conceptual que já tínhamos abordado a propósito da escultura de Marlena Kudlicka, mas que aqui se negoceia de forma mais estruturante e fechada. Ou seja, em Pimentão as decisões são precisas num encobrimento de uma aleatoriedade inicial, enquanto em Kudlicka a indecisão é exposta na sua capacidade formalizadora. 


Para finalizar a Opening Piece de Teresa Henriques, obra concebida especificamente para esta exposição. Objeto perturbante no seu deslocamento de utilização divergente, este estetoscópio cuidadosamente guardado numa caixa e utilizável pelo espectador faculta-lhe uma peça sonora que reitera uma dupla perceção do seu estar no espaço expositivo. Por um lado isola-o na possibilidade de se alhear do ruído que o envolve ao convidá-lo a escutar o seu próprio bater do coração (função primeira e expectável deste objeto), por outro, com a manipulação sugerida do próprio aparelho surge-lhe uma voz a perguntar o que se encontra aí a fazer, numa agressividade intimidante. Público e privado colidem aqui como inquietação de pensamentos induzidos. 


No transcurso de situações históricas, geográficas e estéticas diferenciadas, revela-se nesta exposição uma preocupação questionante da capacidade de gestos e representações se constituírem como enunciados de um pensamento-outro, exatamente aquele que se oferece ao espectador a partir de uma forma de pensamento artístico. 


Una naquilo que propõe, esta exposição ancora-se na multiplicidade das respostas. E será na contaminação especulativa dos vazios entre as obras que melhor se apreenderá a pertinência daquilo a que insistimos em chamar arte. 



Miguel von Hafe Pérez 

Maio 2016

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