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Memória Futura
17

 

September

 

2013
2

 

October

 

2013
Miguel Rios - Memória Futura
Miguel Rios - Memória Futura
Miguel Rios - Memória Futura
Miguel Rios - Memória Futura
Miguel Rios - Memória Futura
Miguel Rios - Memória Futura

A exposição de objetos de design que Miguel Rios apresenta na Galeria Cristina Guerra é uma instalação em torno da presença de duas tipologias de objetos: variações em torno de um dispositivo que não pertence ao nosso léxico de objetos quotidianos mas que poderíamos descrever como inaladores  e uma mesa. Se os primeiros desses objetos não possuem nomenclatura porque não existe uma tradição de uma função social ou pessoal a eles adstrita, a mesa pertence a um léxico milenar que a faz reconhecível por um nome, uma função e um conjunto tipológico.


Comecemos, então pelos objetos que não têm nome.


São dispositivos cerâmicos (uns) em cerâmica e vidro (outros) e um último, mais complexo, em vidro. Estas peças nascem de uma memória de dispositivos do universo laboratorial, sucessivamente redesenhados e reconvertidos para cumprirem uma função, a de proporcionarem aos seus futuros e hipotéticos utilizadores uma experiência olfativa. São peças compósitas que podem ser associadas ao ambiente termal da inalação, do vapor, do odor,

opacas na sua versão feminina e (hélas) transparentes na sua versão masculina. A sua determinação de género é efetuada por um nome: chamam-se Winnie  (na versão feminina) e Willie  (na versão masculina), nomes retirados a Happy Days , a peça de Samuel Becket de 1961. A relação com a peça de Becket perpassa por todo o ambiente  construído para a apresentação dos objetos, nomeadamente a figura feminina de Winnie que, longe de toda a

causalidade, rememoría o seu passado a partir do conteúdo da sua carteira, presa num buraco na terra por razões obscuras. O passado, na obra de Beckett não existe como causalidade, mas como produção de um agente. O objeto que Miguel Rios concebeu a partir deste universo é um dispositivo para a produção de uma memória que é a forma da nossa relação com a construção de um passado.


 Nesse sentido, os inaladores de Miguel Rios são dispositivos que possuem uma determinada função – servem para cheirar odores do passado, como a terra molhada depois de uma chuva, ou um cheiro a infância, algures no campo -, sinalizada por uma bomba de pulverizador de perfume e um bucal. Essa função liga-se, pela conotação hospitalar, a toda uma tradição de dispositivos de inalação, nebulizadores, vaporizadores, que pertencem ao universo termal, ou do sanatório, lugar literário por excelência da produção de memórias – isto é, da sua construção para o futuro, como acontece em Thomas Mann. Por outro lado, no contexto artístico, a fenomenologia do odor e a sua aplicação à respiração e à partilha está intimamente ligada à arte brasileira nascida do neo-concretismo, nomeadamente a Lygia Clark e Hélio Oiticica, a primeira em dispositivos a que hoje chamamos relacionais, o segundo nos bólides que possuíam cheiros (como café, por exemplo) que funcionam como detonadores de memória e um jogo de reconhecimento.


O mesmo acontece nestas peças: elas são um jogo de reconhecimento de universos olfativos que constroem, por si mesmos, memórias, remetendo para a construção futura de um passado. São objetos “esperançosamente

futilitários”, como a própria personagem Winnie foi descrita por Robert Brustein.


As três mesas fazem parte de um sistema de mobiliário de escritório em desenvolvimento, aqui apresentadas na sua versão de projeto, como conceito. O contraste entre o rigor e a opulência do espelhado, a precisão do acabamento, possuem uma conotação quase teatral, certamente performativa.


Desenvolvidas como parte de uma linha de escritório em parceria com a IMO, partem de uma tipologia de mobiliário de escritório que remete para o universo do modernismo da década de cinquenta do século passado. A sua

versão atual, subtilmente assimétrica – e a instalação em linha na Galeria permite compreender a sua assimetria - corresponde a uma edição limitada de 5 exemplares e que poderá vir a fazer parte da gama de mobiliário de administração, encontrando-se em desenvolvimento (numa equipa que também integra a designer Telma Barrelas, colaboradora de Miguel Rios) a adaptação a um sistema de escritório, no qual as suas funcionalidades virão a ser concretizadas.


De reparar que a superfície espelhada é produzida em inox, material que permite a produção (ao contrario do vidro) de um espelhado perfeito, que não duplica a imagem na superfície. A temperatura das mesas, no entanto,

é matizada pelos rebordos em mdf lacado de cores terrosas, temperando o universo frio com mais uma remissão para a combinação de materiais existentes no dealbar da moderna cultura do mobiliário de trabalho para escritório (as combinatórias de madeira, metal e fórmica) que pertence à nossa memória coletiva.


Todo o ambiente de apresentação das obras se encontra envolvido na mesma dimensão cenográfica, como um palco para qualquer ação – que, evidentemente, só se desenvolve no jogo de reconhecimento que podemos

aceitar jogar de construir, para memória futura, os odores reinventados do nosso passado.



Delfim Sardo

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